O Fim da Carreira Tal Como a Conhecemos: Seremos Todos Trabalhadores Gig?

O Fim da Carreira Tal Como a Conhecemos — Gig Economy

Durante grande parte do século XX, a estabilidade profissional era vista como um dos pilares da vida adulta. De facto, a ideia de um “emprego para a vida”, em que um trabalhador ingressava numa empresa e ali construía toda a sua trajetória profissional, parecia inquestionável. No entanto, hoje, essa realidade está em mudança.

As novas gerações já não ambicionam carreiras lineares; pelo contrário, procuram experiências diversas, modelos de trabalho mais autónomos e maior liberdade de escolha. Ao mesmo tempo, também as empresas passaram a valorizar a capacidade de adaptação, a gestão dinâmica de recursos e estruturas mais flexíveis. Assim, a rigidez da economia deixou de ser sinónimo de segurança — e o que era exceção começa a tornar-se norma.

Flexibilidade com Estrutura — o Novo Normal

À medida que o mercado de trabalho evolui, torna-se cada vez mais evidente que a profusão de modelos de trabalho deixou de ser exceção para se tornar norma. Neste sentido, este movimento não se traduz apenas no crescimento da gig economy, com o aumento do trabalho por conta própria ou mediado por plataformas. Além disso, ele também se reflete em outras formas estruturadas de trabalho, como o outsourcing, os contratos por projeto e o trabalho temporário — que já operam há décadas como ferramentas eficazes de gestão de talento.

Estes modelos partilham um mesmo ADN: responder de forma ágil às necessidades das empresas e dos profissionais, sem, no entanto, comprometer os padrões de qualidade. Por isso, em vez de serem vistos como concorrentes, devem ser entendidos como partes complementares de um ecossistema laboral em transição, onde diferentes formas de vínculo coexistem para dar resposta a contextos distintos.

Aliás, um estudo da McKinsey revelou que, já em 2022, mais de um terço (36%) da força de trabalho dos EUA se identificava como independente. Não só isso, mas entre 2022 e 2024, as contratações de freelancers por empresas norte-americanas cresceram 260%. Estes dados reforçam uma realidade crescente: as empresas estão a repensar os seus modelos de contratação; os profissionais estão a encontrar oportunidades de trabalho que há alguns anos não existiam.

O trabalho temporário, por exemplo, continua a demonstrar uma enorme vitalidade. Em Portugal, a faturação das empresas do setor cresceu 60% entre 2020 e 2023, impulsionada, em grande parte, pela recuperação económica no pós-pandemia. Consequentemente, em 2024, voltou a crescer 5%, atingindo os 1.975 milhões de euros — números que refletem a robustez do modelo e o seu papel ativo na dinâmica do emprego e da economia.

Deste modo, este tipo de evolução mostra que os modelos híbridos — que combinam adaptabilidade com segurança — são não só possíveis, como também adotados crescentemente. Assim, é neles que reside uma resposta mais robusta para um mercado de trabalho que já não cabe em moldes binários e trabalhadores que procuram somar experiência, conhecimento e estímulo profissional.

Nem Tudo é “Gig” — Um Mercado Híbrido e Consciente

Não sejamos naïves, pois flexibilidade não é informalidade. O futuro do trabalho não será feito exclusivamente em regime freelancer, porém, provavelmente também não regressará aos moldes tradicionais do século XX. Será, tudo aponta, híbrido — e exigirá modelos que combinem autonomia com responsabilidade, agilidade com enquadramento.

Nesse sentido, a gig economy é parte desse ecossistema. No entanto, não responde a todas as necessidades — nem das empresas, nem dos trabalhadores. Em muitos casos, falta-lhe regulamentação, acompanhamento e perspetivas de evolução.

Por isso, é aqui que modelos mais consolidados oferecem uma alternativa mais equilibrada. Modelos que combinam a agilidade operacional com a segurança contratual, como o trabalho temporário, permitindo às empresas ajustarem-se rapidamente às flutuações do mercado, sem, contudo, abdicar de práticas responsáveis.

Além disso, para muitos profissionais, representam não apenas uma entrada no mercado, mas também uma via de progressão, aprendizagem e reintegração.

gig economic

O Desafio Está no Desenho das Soluções

O ponto crítico não é escolher entre o modelo tradicional ou o alternativo, mas sim compreender que é necessário redesenhar as soluções laborais para que sejam justas, sustentáveis e adaptadas às necessidades reais. A flexibilidade pode — e deve — ser uma força, desde que seja pensada com responsabilidade.

Por isso, modelos como os presentes na gig economy terão um papel cada vez mais estratégico nesse redesenho. No entanto, não como substitutos de relações de longo prazo, mas sim como peças fundamentais de uma nova arquitetura laboral, onde diferentes formas de vínculo coexistem para garantir resiliência, inclusão e competitividade.

O futuro do trabalho não será uma escolha entre passado e inovação. Pelo contrário, será uma construção coletiva, feita de equilíbrio — entre liberdade e estrutura, entre inovação e proteção.

 
foto thomas artigos

Thomas Marra

Country Manager da Gi Group Portugal

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