Ruben Amorim e como escolher o projeto certo

Poucos eventos na nossa vida têm tanto impacto como mudar de projecto profissional, pelo que nos devemos assegurar de que os drivers para a mudança são os correctos e de que a escolha é o mais objectiva possível.

Recentemente, o Manchester United, comandado por Ruben Amorim, sofreu uma humilhante eliminação na Taça da Liga Inglesa, sendo afastado da competição por uma equipa da quarta divisão. Este percalço é o ponto mais baixo de um percurso que se adivinhava difícil, mas creio que nem o próprio antevia tantas dificuldades ao trocar o campeão português por um clube de dimensão mundial, ainda que em evidentes dificuldades ao longo dos últimos anos.

Para quem está motivado ou interessado em abraçar um novo projecto profissional, este desaire permite tirar algumas ilações sobre como fazer uma escolha consciente as sente em pilares estratégicos.

Num mundo corporativo volátil, onde transições entre empresas são comuns, seleccionar o projecto certo é crucial. Os líderes de topo, como CEO e directores-executivos, enfrentam pressões semelhantes às de treinadores de elite: expectativas altas, recursos limitados, práticas e processos muitas vezes desadequados e pouco flexíveis, assim como culturas organizacionais complexas. Uma má escolha pode destruir reputações construídas ao longo de anos, levando a demissões prematuras, danos financeiros, mudanças não desejadas em equipas, entre outras.

O que devemos fazer para escolher bem? O pilar fundamental é o da cultura: se houver desalinhamento, não há estratégia, recursos ou processos que valham. Ruben Amorim, para além da competência técnica, viu o seu trajecto no Sporting ser reconhecido como um exemplo de liderança e comunicação, criando uma equipa que se habituou a ganhar e a ter uma cultura de excelência, de trabalho árduo e de performance de alto nível. Todavia, chega a Manchester sob um clima de dúvidas sobre o seu valor, o que não terá seguramente ajudado ao pegar numa equipa em descrédito. Efectuou várias mudanças, sejam tácticas, novas contratações, dispensas, mas nunca conseguiu mudar a cultura nem unir a equipa em busca de objectivos comuns e ambiciosos.

Nunca devemos desvalorizar o contexto. Por muito competentes que possamos ser, por muita experiência que tenhamos, se as condições não estiverem reunidas, não teremos sucesso.

Visto o tema da cultura, urge saber se teremos os recursos necessários para cumprir a missão. Há suporte financeiro, equipa qualificada e autonomia para implementar mudanças, caso sejam necessárias? Vai estar sob avaliação a partir do primeiro dia, por isso é fundamental garantir que tem as condições necessárias para cumprir os objectivos a que se propõe. Ruben Amorim herdou uma equipa cara, alguns nomes sonantes, outros em tentativa de afirmação. Procurou fazer várias mudanças, trazendo novos jogadores, dispensando outros, mudando o sistema, mas por vezes não teve os recursos, financeiros e temporais, necessários para uma mudança tão profunda.

Timing e contexto são críticos. E o momento certo para assumir o risco de mudança? Realize uma due diligence profunda: converse com sta kcholders internos e externos, estude métricas, simule cenários. Analise também as perspectivas para o seu sector de actividade. Muitas vezes, o projecto parece ser o ideal, mas o contexto é desfavorável . 0 treinador português estava invicto no campeonato, a caminho de bater todos os recordes, mas optou por sair para um projecto de alto risco a meio da temporada. Era o projecto certo? No timing certo?

Definir critérios pessoais claros, limitações, ambições e condições necessárias, como equilíbrio vida-trabalho e impacto em quem o rodeia, evita tomar decisões impulsivas baseadas em prestígio, status ou salário, procurando que a decisão seja o mais racional possível.

Numa época em que o mundo de trabalho muda tão rapidamente, com novas competências a surgirem e o crescente impacto da inteligência artificial, procure perspectivar o longo prazo vs. o curto prazo, isto é, o que é que uma mudança pode significar a 5/10 anos face à permanência no actual projecto.

Abraçar um novo projecto, se as condições certas estiverem reunidas, é estimulante, desafiante e proporciona crescimento a vários níveis. Devemos garantir que é uma escolha objectiva e bem fundamentada, porque o impacto do insucesso não deve ser subestimado e, infelizmente, os severance package no mundo corporate ficam distantes dos futebolísticos. 

Por muito competentes que possamos ser, por muita experiência que tenhamos, se as condições não estiverem reunidas, não teremos sucesso.

Nuno Troni

Business director de Search & Selection da Gi Group Holding Portugal

Share this news

Descubra mais